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Sam ao Luar

Sam ao Luar

04
Jun21

Não aguento mais contigo.

Sam ao Luar

- Não aguento mais contigo! - afirmei, enquanto o atirei para longe.

Aquele vestido já não me serve, não me fica bem. Já nada me fica bem. Já não me reconheço neste corpo. Desde que o bebé nasceu, que já não consigo olhar para o espelho. A cicatriz ainda me dói... nem a fralda eu consigo trocar. Tenho que me ajoelhar. Dói-me tanto as costas!

Estou tão cansada. Cansada das fraldas, das mamadas, das fraldas outra vez, das papas, noites sem dormir, mamas dormentes, cabeça dormente, costas dormentes... Quero fugir.
Já não me lembro de tomar banho, trocar de roupa, maquilhar-me, sair para trabalhar. Aquele f... despediu-me. Só porque estava grávida! Grande merdoso. Se fosse a esposa dele a ser despedida, ligava para as autoridades. E agora? O que vai ser da minha vida?

Estou feia, triste, dormente por dentro. Eu vi a conversa dele com ela, on line. Acho que ele não sabe que vi. Ele também já não deve gostar de mim, por isso lhe falou assim. Nunca conversou comigo assim. Também precisei tantas vez do seu apoio e ele nunca me encorajou assim. Ele convidou-a para um café. Eu sei que eles trabalham juntos e que ele chega sempre tarde a casa. A viagem é tão curta, porque demora tanto tempo? A noite cai tão cedo e eu conto os minutos todos até ele chegar. Para me sentir acompanhada outra vez... Eu sei que ele não tem saudades minhas.

Eu sou fria. A mãe disse-me que eu era fria e calculista. Ainda era adolescente e ela tinha razão. Nunca me ensinaram a ter mimo nem a dar mimo. Não lhe sei dar mimo e ele queixa-se. Será por isso que já não tem saudades minhas?

Eu sei dar mimo. O meu bebé sabe que eu sei. Aqueles dedinhos tão perfeitinhos e aqueles olhos que só me apetece beijar, olham para mim como quem olha para quem dá mimo. Eu amo-o tanto! Não sabia que era possível. Eu ouço mal... e se ele chora a meio da noite e eu não acordo? Não posso pegar no sono profundo. Estou tão cansada! E se ele precisa de mim?...

Queria tanto mergulhar na banheira. Mergulhar de cabeça e sentir paz e silêncio e sossego... Vou encher a banheira e acabar com isto de uma vez. Espera, ele tem que chegar a casa primeiro. O bebé vai ficar sozinho, pode precisar de mim. Eu tenho que ficar aqui... por enquanto. Ele ainda ficou na festa com os nossos amigos. Ouço os foguetes, mas não tenho ninguém para festejar. Ainda ontem esteve no café com o pessoal. Porque quer estar com eles e não connosco?

Vou abrir aquela garrafa. Já está no frigorífico há tanto tempo, deve estar fresco. Vou adormecer num instante e já não vou sentir mais nada. É isso! Não posso... e se ele chora outra vez?

https://desafiodospassaros.blogs.sapo.pt/

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